quinta-feira, 11 de junho de 2009

Jogo de vida e morte

A tradicional placa afixada na árvore do principal canteiro da praça Dr. Oswaldo Cruz, em São Luís do Paraitinga, anunciava durante a semana o grande confronto futebolístico de domingo à tarde no Campo da Ponte. Canário X São Caetano: um jogo de vida e morte.
Não estava em disputa apenas o passaporte para o título de campeão luisense de 1974. Mas um tabu que perdurava por mais de 25 anos em que o Canário não vencia a forte equipe do São Caetano.
O Rei Canário – apelido do dono do time – Anésio Rodrigues da Silva como sempre apresentava estrelas de outras localidades (enxertos) para dar um certo clima a sua equipe. Foram tantos que ficaram gravados em nossa memória como o Charanga, Cocão, Pato Roco, entre outros. Para este embate, Rei Canário anunciara a estréia do grande centroavante Ticão.
Minutos antes da partida Rei Canário não conseguia apresentar o atleta. Os outros jogadores já estavam concentrados na velha casa do Rei, na esquina do jardinzinho, em frente ao cinema, onde a grande atração era a miniatura de um avião amarelo, pendurado no teto da sala com a fotografia dos escrete canarinho que conquistou o bicampeonato mundial de 62.
Para não frustar a sua torcida, o Rei Canário me chamou num canto e anunciou que eu iria jogar com a camisa 9 e diante da equipe me apresentou como Ticão.
Era mais uma das histórias do Rei e logo eu que nunca tinha disputado um campeonato e só havia jogado umas peladas, fiquei todo garboso.
A torcida, em polvorosa, dividia a cidade. Fogos, agitação e uma grande movimentação de pessoas entre a praça e o Campo da Ponte. É chegada a hora. Os jogadores do Canário saíram perfilados da casa do Rei atravessando a praça ovacionados pela massa.
Em campo, antes do início o jogo, durante o aquecimento de goleiro, o primeiro chute que dei pegou de lado, como diria na orelha da bola atingindo a cabeça do Rei Canário, que estava com a enxada nas mãos, dando os últimos retoques no “gramado”. Ele deve ter pensado: que decepção...
Como narraria Fiori Giliotti, abrem-se as cortinas e começa o espetáculo. Jogo de decisão todo mundo sabe é tenso, pegado, não ia pra lado nenhum. O forte ataque do São Caetano força o goleiro Raul a grandes defesas. Até que a bola sobra no campo de ataque do Canário e dentro da área e o centroavante faz a alegria da galera, de maneira indefensável para o goleiro Bitu:1 a 0 Canário.
A resposta veio em seguida, o São Caetano empata. Mas antes de terminar o primeiro tempo, novamente o camisa 9 do Canário abre um rombo na defesa do São Caetano, chutando entre as pernas do grande, e grande mesmo, zagueiro Zezão e põe a bola dentro do gol . O juiz apita o final do primeiro tempo. É só festa para a torcida do Canário. O tabuleiro de manjar e a cesta pastel já tinham voado pelos ares, num gesto típico do Rei.
Recomeça a partida, procuro o Rei Canário entre os torcedores e não o vejo. De repente o encontro solitário, sentado no alto do morro da Dona Fanny se apegando às suas orações e olhe que só quem conhece o Rei sabe que não são fracas, não!
Mas o São Caetano é forte e valente. Logo no início do jogo, para desespero da torcida Canarinho, o São Caetano chega ao empate. O jogo prossegue em grande pressão das duas equipes, mas a tarde era mesmo do centroavante camisa 9 do Rei Canário. Uma bola cruzada da direita, o atacante se antecipa dos zagueiros e novamente surpreende a defesa do goleiro Bitu. Estava decretada a vitória do Canarinho: 3 a 2.
Grande resultado. A esta altura era só festa, rojão e cestas de pastel cruzando os céus do campo da ponte. A criançada em delírio atrás do Rei Canário. Quando o juiz apitou o final da partida, a cena que ficou gravada em minha memória foi a do torcedor símbolo do canário Tonho Garrafão, que pegou a mesa do representante e a partiu ao meio com uma cabeçada. Daí por diante só foi festa e histórias e … ainda bem que o apelido de Ticão não pegou e continuo o Zeco do Waldemar...

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